quinta-feira, 29 de abril de 2010

"Pai, vou namorar com a Beatriz!"


Ontem saí com o meu filho para um evento social. Nada de mais, apenas um jantar de aniversário duma pessoa amiga ao qual não podia de forma alguma faltar. O fim-de-semana era para tomar conta do filhote, e por isso acabei por levá-lo comigo.

Chegado ao restaurante constatei que a maior parte das pessoas também traziam companhia, mas no meu caso o Martim era o único que não conseguia tocar com os pés no chão!

A ternurenta imagem do meu filho sentado na cadeira com as pernas entrelaçadas a baloiçar, fez-me pensar no mais recente anúncio da Sumol, e foi de facto com indisfarçavel embaraço que constatei o seguinte: para mim sair à noite é cada vez mais ir até ao caixote do lixo ao fundo da rua, e já está.

A minha vida social não está parada, está ligada à máquina a vegetar. Entre isto e ficar a ver quanto tempo demora um caracol ferido de morte a subir ao topo dum eucalípto é difícil escolher. Sem ofensa para o caracol claro.

Claro que nada disto acontece porque acordei num belo dia de manhã e disse Ooh! Era tão giro ser virgem outra vez!

O problema coloca-se duma forma aparentemente simples, mas paradoxalmente sem solução possível, senão vejamos:
O dia tem 24 horas, mas dez horas e meia de 2ª a Sábado estão ocupadas com trabalho. Sobram treze horas e meia, tempo mais que suficiente para as minhas coisinhas, certo? Errado.

Continuemos, mas sem contabilizar o Domingo, dia que reservo para ir ao golfe, almoçar fora, jogar à bola e fazer tudo isto e montes de outras coisas que todos os pais gostam de fazer com os filhos. Excepto quando estou a trabalhar, porque também tenho Domingos assim.

O dia começa quase sempre muito cedo, por volta das 7h. A rotina repete-se e depois da barba, do banho e da roupa, desço para comprar pão e tratar do pequeno almoço e lanche do Martim. Às 8h acordo-o, e depois de 10 minutos na ronha finalmente convenço-o a arrastar-se até ao sofá da sala, quase sempre subornado pelos desenhos animados da RTP2. Às 8.30h começo a vesti-lo, 5 minutos depois vai lavar os dentes e pentear, e se tudo correr bem às 8.50h estamos a sair de casa já a caminho da escola.

Sobram 13 horas e meia mas na verdade são apenas 11 horas e meia porque o despertador toca às 7h da manhã. Todo o santo dia carambaaa!

Quando chegam as 19.30h é altura de regressar a casa, mas a essa hora o trânsito reclama pelo menos 30 minutos pelo caminho. Mais duas horas para o banho, jantar e lavar a louça, e há que tratar da roupa para o dia seguinte, tarefa que exige pelo menos mais 30 minutos nos melhores dos dias.

Se há coisa que ainda não sei fazer em tempo útil é passar a ferro. Deviam inventar uma espécie de Bimby mas para a tábua de engomar. Tornava tudo tão mais simples!

Ora bem, sobram 8 horas e meia mas tenho a ideia de que estou a esquecer-me de qualquer coisa.. Ah, é verdade! Tenho de dormir! É isso!

O sucesso da minha vida pessoal está portanto dependente da única coisa que nos permite manter a saúde física e mental, bem como as nossas competências profissionais e boa-disposição: o sono.

Mais dum lado significa menos do outro, e bem vistas as coisas – usando uma linguagem mais grosseira – se descanso a cabeça de cima deixo a outra de baixo entregue à solidão e ao abandono. ‘Tadinha..

O drama maior é que mais sexo – ou qualquer sexo já agora – significa menos horas de sono. Menos horas de sono significam mais cansaço, que por sua vez levam a pior sexo e menos horas de sono ainda! Nas palavras do mítico Artur Albarran, o drama, o horror..

Olhando para a minha rotina diária, e mesmo que reserve para mim umas míseras 6 horas úteis de sono, restam-me apenas duas horas e meia para investir na minha vida social. E a pergunta que se coloca é esta:
O que é que está ao alcance de qualquer homem com cão em 150 minutos apenas?
A resposta é simples. Depende da mulher com gato.

Se levarmos em linha de conta que a minha Kangoo não consegue ultrapassar os 110 kms/h a direito em dias com pouco vento, 30 minutos de caminho mais o estacionamento dão-me para chegar a Lisboa quanto muito. Depois é preciso regressar, e no ir e voltar subtraimos 60 minutos aos 150 disponíveis. Sobram 90 minutos para um café. Dramáticoooo!

Entre os olás, os beijinhos, a conversa para quebrar o gelo, e o ficar mais à vontade gastam-se pelo menos uns bons 30 minutos de muito boa conversa, e já não é para qualquer um.

Ou seja, partindo do princípio de que tudo corre bem nos primeiros 30 minutos, e que em meia-hora é possível deixar uma mulher com gato completamente à vontade e disponível, sobram uns incríveis 60 minutinhos para conseguir fazer tudo isto:
Criar o clima certo para o primeiro beijo, perceber quem quer ter a iniciativa, decidir quando tomar a iniciativa, dar o tal primeiro beijo, fazer com que não seja o último, perceber quando é que se pode meter as mãos, e sobretudo quando é que devemos parar e deixar que o silêncio sugira e agora? sem esquecer de pagar a conta do café.

E mesmo que tudo corra bem até aqui, é inevitável não começar a roubar horas à almofada depois disto, e eram só 6 lembram-se? Nao é facil.

Claro que tudo isto depende da mulher com gato, e se há quem felizmente faça do sexo um assunto sério que deve ser experimentado sem constrangimentos emocionais e com sentido de humor, há por outro lado há quem entenda o sexo como algo de terrivelmente sério, e que só faz sentido ser vivido quando existe um sentimento maior e mais nobre, chamado amor. E ai de quem diga o contrário. A fogueira está logo ali a fumar em lume brando.

Nestes casos muito sérios (e muito aborrecidos também), o sexo raramente é visto como um instrumento de prazer para os dois, mas quase sempre como um prémio:

Apaixonado Recente: Ora bem, então se eu levar o amor isso dá-me direito a quê?

Senhor da Loja: Ehpa se levar o amor tem tudo incluído!

Apaixonado Recente: Ehh! Tudo mesmo?

Senhor da Loja: É como lhe digo! Melhor que isto só o México em tempos de gripe!

Apaixonado Recente: Espectáaaculo! E tenho direito a sexo também?

Senhor da Loja: Oh meu amigo! Quando se ama é a qualquer hora!

Apaixonado Recente: Ehpa, mas eu não amo a outra pessoa..

Senhor da Loja: Oh homem, diga que gosta muito pronto. É quase o mesmo.

Apaixonado Recente: E depois como faço se acabar mais tarde?

Senhor da Loja: Oh homem, olhe diga que estava confuso e que pensava que era amor. ‘Tá sempre a acontecer.

E é exactamente isso, está sempre a acontecer.

Se por um lado é certo e sabido que no sexo os homens comem o que podem e as mulheres comem o que querem, no amor quem anda à chuva molha-se, e é muitas vezes a obrigação de chegar a um relacionamento mais profundo e a necessidade de validar sentimentos que acabam por destruir as relações, tudo porque ainda existem mulheres com gato que continuam presas a ideias preconceituosas e moralismos obsoletos, preferindo ocultar o prazer em vez de revelar esse mesmo prazer.

Não me entendam mal, nada tenho contra o amor. Acredito plenamente na ideia de que um dia irei voltar a percorrer esse caminho, mas também acredito que existem outras formas de satisfação e realização pessoais, e em 60 minutos apenas não creio que a nobreza dos sentimentos seja suficiente para subverter as leis físicas da atração.

E essas são muito simples, e funcionam de forma instantânea quando dois corpos se atraem. Quanto muito basta juntar um café.

Quando terminamos o jantar, e já a caminho de casa, o meu filho confidenciou-me no carro que na 2ª Feira vai ter um jogo de futebol importantíssimo até aos 3, com um coleguinha lá da escola. A ideia nem sequer foi deles mas sim da Beatriz, e é muito simples: quem ganhar namora com a Bia.

É desconcertante a forma como os miudos resolvem os problemas dos adultos.